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Escrito por: Ludmila Caminha Barros
Fecha de redaccion:
Organizaciones: Association pour contribuer à l’Amélioration de la Gouvernance de la Terre, de l’Eau et des Ressources naturelles (AGTER)
Tipo de documento: Artículo / documento de difusión amplia
Los cambios recientes del Código Forestal de Brasil, impulsados por el Gobierno Federal a pesar de la oposición de la Sociedad Civil, confirman el peso que tiene el agronegocio en las orientaciones políticas del país.
Este articulo (Oct. 2011) de la Doctora Ludmila Caminha Barros no esta disponible por el momento en castellano, sino solamente en portugués. Para conocer más sobre el tema, les recomendamos revisar los enlaces en nota de pie.
O modelo de desenvolvimento rural hegemônico no Brasil desde os primórdios da colonização é a monocultura exportadora. Valendo-se da superexploração1 da mão de obra, da apropriação ilegal de terras públicas2 e da destruição das florestas, o Brasil tornou-se forte no mercado global de commodities agrícolas, assegurando o equilíbrio do seu balanço de pagamentos. Esta posição também deve muito à abundância de políticas públicas de suporte: a monocultura exportadora se apropria da maior parte dos investimentos públicos para a agricultura3, recebendo em face da agricultura familiar4 – que é quem produz os alimentos que o povo consome – a maioria dos investimentos para infraestrutura produtiva, financiamento à produção, assistência técnica e extensão rural, pesquisa e desenvolvimento, associativismo e cooperativismo, etc. Isso não se consegue sem hegemonia política a assegurar o controle de governos locais e dos poderes legislativos nos três níveis da Federação.
Apesar de representantes do agronegócio reconhecerem “que é possível aumentar a produção de alimentos sem a necessidade de abdicar das áreas de proteção ambiental, só com investimentos para aumentar a produtividade” e de um ex-ministro da Agricultura5 fazer coro aos que afirmam que « hoje as áreas degradadas de pasto ocupam o mesmo espaço das culturas de grãos”, não falta quem insista que a preservação das florestas no Brasil obsta a produção de alimentos no País. Se, no final do século XIX, os fazendeiros argumentavam que era impossível abolir a escravidão sem tirar a competitividade da produção agrícola brasileira, hoje acusam as florestas de obstar a produção de alimentos!
Assim, em bases irracionais e equivocadas, está ocorrendo a modificação do Código Florestal brasileiro. Nada adiantou uma pesquisa6 do Instituto Datafolha mostrar que a imensa maioria da sociedade civil brasileira é contra a mudança do Código Florestal. Todo ano, durante a estação das chuvas, enchentes inundam as cidades à beira dos rios e deslizamentos de terras nas colinas urbanas matam milhares de pessoa. Mas, essas mortes repetidas não convencem da necessidade de proteger a vegetação cuja integridade as impediria: o projeto de lei substitutivo permite a supressão de 50% dessa vegetação.
Em uma vã tentativa de trazer racionalidade científica ao debate, um estudo conjunto da Academia Brasileira de Ciências e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência7, argumentou a importância da reversão da degradação ambiental e da manutenção da vegetação nativa às margens dos corpos d’água e nas encostas dos morros para o controle da erosão. O trabalho das principais instituições de pesquisa brasileiras foi desmerecido pelo deputado relator do projeto, que o acusou de ter sido financiado pelo « lobby ambientalista formado pelo Greenpeace e WWF8. Para piorar, o novo texto legal não apenas reduz o tamanho da área sob proteção, como também facilita a obtenção das licenças para o seu desmatamento.
Foi em vão também que o Sub-Procurador Geral da República, em audiência pública no Senado realizada em 13 de setembro com juristas, afirmou que essas mudanças impedem o Brasil de cumprir com seus compromissos internacionais em matéria ambiental, principalmente, no que se refere à estabilização do clima. A observância dos compromissos internacionais do Brasil exige não apenas que se mantenha os níveis atuais de proteção, mas também que se recupere o passivo ambiental resultante da degradação das áreas hoje protegidas no Código Florestal. A Presidente Dilma Roussef promete vetar quaisquer dispositivos legais que impeçam o Brasil de cumprir as metas e compromissos assumidos sobre a estabilização do clima.
O maior passivo ambiental do meio rural brasileiro, apontado pelo referido estudo da ABC/SBPC, é composto pelas Áreas de Reserva Legal – ARL que foram irregularmente suprimidas. Essas áreas consistem em percentuais de vegetação nativa a serem preservados nas propriedades rurais, pois possibilitam a conectividade dos remanescentes florestais, permitindo o deslocamento e a dispersão das espécies na paisagem. O manejo das espécies da ARL não apenas é possível, é também economicamente interessante para a diversificação da produção rural. Mas essas áreas foram, em grande parte, desmatadas e, apesar da legislação em vigor impor sua recuperação, esta não ocorreu. O novo texto de lei mantém os percentuais atuais, mas isenta quem já removeu essa vegetação da obrigação de recompô-la. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA9, tendo por base a área total dos imóveis rurais brasileiros e aplicando os percentuais de reserva legal previstos no atual Código Florestal para cada tipo de vegetação, afirmou que o Brasil deveria possuir uma área total de 258,2 milhões de hectares de reserva legal. Aplicando o índice de passivo obtido para cada município, o IPEA estimou um passivo total de reserva legal de 159,3 milhões de ha (61,7% da área total de reserva legal prevista na lei atual). Seria este o total da área de florestas que a nova lei isenta os desmatadores da obrigação de recuperar.
O Código Florestal não é a única lei ambiental brasileira que está sendo alterada para favorecer ainda mais os interesses da monocultura exportadora. São várias as iniciativas legislativas no Congresso Nacional para diminuir a proteção ao ambiente no Brasil, que vão da flexibilização do licenciamento ambiental de grandes obras de infraestrutura à transferência da competência do Poder Executivo de criar áreas protegidas para o Poder Legislativo. Em junho de 2009 a sociedade civil brasileira publicou um manifesto10 contra essas iniciativas. Dois meses depois, foi instalada uma Comissão Especial na Câmara dos Deputados para discutir as modificações do Código Florestal, com muita animosidade entre os parlamentares componentes. Esta Comissão manteve o domínio dos representantes do agronegócio em sua composição e, sempre que pôde, usou mecanismos de segurança para restringir ou impedir representantes da sociedade civil de acompanhar os debates11.
Apesar das duras críticas, o péssimo texto produzido pela referida Comissão foi aprovado. Durante a votação, o anúncio do assassinato de um trabalhador da floresta e sua esposa foi recebido com vaias, como num macabro cântico de triunfo da lavoura arcaica brasileira. A esses dois crimes, seguiram-se mais 2 assassinatos, no curto espaço de uma semana. No dia 14 de junho deste ano, já eram seis os mortos no norte do Brasil, sendo 5 apenas no estado do Pará12.
Ficou para o Senado Federal a responsabilidade de minorar o dano. Mostrando-se mais sensível, o Senado já ouviu cientistas, juristas e dez ex-ministros do meio ambiente, que fizeram duras críticas ao Projeto de Lei.
Apesar disso, seus poderes mais limitados do que parecem, pois as modificações que o Senado fizer deverão ser aprovadas pela mesma Câmara dos Deputados que aprovou as modificações do Código Florestal. Mais ainda, o veto presidencial deve ser apreciado em sessão conjunta das duas casas do parlamento brasileiro, que podem promulgar a lei mesmo assim. Restará aos opositores questionar a conformidade da nova lei perante a Constituição junto ao Supremo Tribunal Federal brasileiro.
O fato é que, no novo texto, até agora, os interesses da lavoura arcaica prevalecem sobre os interesses do País e do planeta. Em nome da ‘segurança jurídica para o produtor rural’ atropela-se a Constituição Brasileira e o direito fundamental ao ambiente equilibrado; ignora-se a crise climática global; trata-se uma imensa reserva de valor como lixo; expõe-se o habitante das florestas brasileiras à perda de seu meio de vida, ao êxodo rural e à marginalização nas cidades. Teremos uma lei de florestas que, ao invés de políticas florestais, estabelece regras para a conversão do solo para a agricultura. Enquanto que, em outros países, a conservação das bases de recursos naturais estão acima das divergências político-partidárias, no Brasil ocorre o oposto, com a oposição entre ‘ruralistas’ e ‘ambientalistas’. Aqui, mais de trinta anos depois do Relatório Brundtland, ainda é preciso convencer setores importantes da sociedade de que é possível e é preciso conciliar desenvolvimento econômico com preservação ambiental.
A Mata Atlântica era a segunda maior floresta tropical do Brasil, cobrindo toda a faixa litorânea do país, mas as monoculturas, principalmente da cana de açúcar e do café, a urbanização e o crescimento da população do litoral, fizeram com que a área original de mais de 1.300.000 km2 fosse reduzida a 50.000 km2, cerca de 7% da mata original13. O Cerrado (savana brasileira) tem hoje 34% de sua área original e perde cerca de três milhões de hectares ao ano14 para pastagens e plantios de soja. A Floresta Amazônica já perdeu 18% de sua área original15 e, apesar de contido em períodos recentes, sua destruição voltou a aumentar15.
‘A Amazônia é nossa!” bradam muitos brasileiros diante das manifestações estrangeiras em defesa desta floresta. Sim, de fato, é nossa, integra nosso território, nosso domínio e se sujeita às nossas leis. Propor a ‘internacionalização da Amazônia” é tão absurdo quanto seria sugerir que a Normandia ou a Provença saíssem do domínio da França para o domínio da ONU! Mas, para que defendemos tão ferozmente nosso domínio sobre as florestas brasileiras? Para o Brasil fazer delas uma inigualável vantagem comparativa e promover o uso sustentável de suas riquezas, em favor do bem estar dos seus habitantes? Ou apenas para assegurarmos a exclusividade da prerrogativa de destruí-las e assassinar seus habitantes?
Brasilia, octubre 2011.
2na introdução ao Livro Branco da Grilagem de Terras (MDA/Incra:1999): “ Em todo o país, o total de terras sob suspeita de serem griladas (ilegalmente apropriadas) é de aproximadamente 100 milhões de hectares - quatro vezes a área do Estado de São Paulo ou a área da América Central mais México”.
4www.mda.gov.br/plano-safra/xowiki/credito
7O Código Florestal e a Ciência – contribuições para o diálogo www.abc.org.br/IMG/pdf/doc-547.pdf
8www.socioambiental.org/banco_imagens/pdfs/SBPC_REBATE_ALDO.pdf
9Comunicados do IPEA nº 96 implicações do PL 1876/99 nas áreas de reserva legal - 8 de junho de 2011 agencia.ipea.gov.br/images/stories/PDFs/comunicado/110616_comunicadoipea96.pdf
10www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=2895
11No Brasil, a Câmara dos Deputados e o Senado se dividem em comissões temáticas para elaborar e analisar os projetos de lei e normalmente, esses debates são de acesso público, qualquer cidadão pode presenciá-los. As pessoas que tentaram assistir a apresentação do relatório sobre o Código Florestal tiveram que se inscrever com antecedência e sua entrada no local foi controlada pela Polícia Legislativa.
13www.educared.org/educa/index.cfm?pg=oassuntoe.interna&id_tema=6&id_subtema=7
14www.conservation.org.br/arquivos/RelatDesmatamCerrado.pdf
15www.oecoamazonia.com/br/blog/293-desmate-cai-em-julho-mas-acumulado-aumenta